A máquina do biopoder

Na Grécia antiga, vários povos se fixavam numa coletividade urbana com soberania política o que conferia o status de cidade-estado e então chamada de pólis. Ao transferir esse conceito para […]



Na Grécia antiga, vários povos se fixavam numa coletividade urbana com soberania política o que conferia o status de cidade-estado e então chamada de pólis. Ao transferir esse conceito para o mundo contemporâneo, observa-se que a pólis cresceu absurdamente, aliás diga-se: as várias pólis pelos continentes do mundo que agora assumem o status de metrópoles e megacidades, pois hoje elas expandiram as fronteiras, alcançaram os limites com as circunvizinhanças e tiveram que desmatar as florestas nos pontos periféricos para propiciar a construção de novas habitações e edificações, tudo isso sem haver qualquer planejamento, racionalidade e sustentabilidade, daí nesse cenário a relação homem-natureza se coloca numa tênue linha de conflito quando se percebe que a vida selvagem das matas estão invadindo as selvas de pedras.

Juntamente com essa expansão, a vida exótica vinda das matas passaram a coabitar com os humanos na área urbana e, até mesmo, começar a ser explorada economicamente pelo homem (sentido genérico todos os humanos) para obter os lucros que são a base para a sobrevivência na vida moderna que há séculos vem sendo a norma, uma vez que de todos os animais da natureza, é o homem o único que, para obter os recursos dela, criou o conceito de posse de bens para consumo e conforto material que são obtidos em troca de algo que representa valores: o dinheiro.

Nesse contexto, a cidade de Wuhan acabou sendo o berço de um novo habitante no planeta, o Sars-Cov-2, um vírus oriundo dessa relação exploratória do homem com a natureza, através do morcego e passado por outros animais que em um dado momento surgiu essa espécie capaz de causar sérios danos à saúde da humanidade.

O vírus passou por todos os lugares do planeta, porém ao chegar em terras estranhas abaixo da linha do Equador, localizado na América do Sul e governado por um projeto de ser humano, um homúnculo, uma quimera para assim dizer, com falas negacionistas, apoiado por um grupo de “senhores de engenho” que exploram e oprimem a população sem qualquer escrúpulo para se manter no poder, por um corpo de forças armadas enaltecida por parte do povo, mas que nem de longe defende a gente brasileira, com discursos de desobediência a qualquer regra do mundo científico e sanitário que agitava uma população de adultos, com reduzida capacidade intelectual, que mais se comportavam como adolescentes sob efeito de entorpecentes, o vírus teve uma perfeita simbiose com esse líder político que representava essa estranha gente que habita no planeta um lugar chamado Brasil.

Para a triste realidade dessa gente, o presidente da República do Brasil, Jair Bolsonaro, incorporou o vírus para si, utilizou de todos os meios para contradizer as autoridades sanitárias com respeito a prevenção da doença que acabou tendo o codinome “bolsovírus”, pois, assim sendo, essa personagem da história do Brasil e agora do mundo exerceu o biopolítica da população  tal qual é explicada pelo filósofo francês Michel Foucault, pois as ações do presidente da república, dos seus asseclas e seguidores com o apoio de segmentos da sociedade como os empresários detentores do capital e líderes religiosos evangélicos, conhecidos nacionalmente, muito contribuíram para propagar o vírus e eliminar os indesejados da sociedade: os idosos, os pobres, os pretos, as empregadas domésticas e outras classes de trabalhadores humildes. Esta aí a Comissão Permanente de Inquérito da Covid-19 (CPI da Covid-19) para dar provas sobre essa indústria da morte que se passou no país, uma verdadeira necropolítica com especial destaque para a adoção da imunidade de rebanho que resultou nas centenas de milhares de mortes, o gabinete paralelo para promover o uso do “tratamento precoce”, o tráfico das vacinas e a objetificação e monetização da vida feita pela empresa de plano de saúde Prevent Senior quando determinava até que dia os pacientes deveriam ter oxigênio ligado.

Todo esse cenário só mostra que a solução para o vírus e a doença, não se trata simplesmente de uma causa biomédica, porém de ações políticas que se tivessem observado com boa vontade humana as orientações sanitárias dos órgãos nacionais e internacionais, o Brasil não teria chegado as tristes cifras de mais de 600.000 mortes por Covid-19. Uma parte da classe médica e demais profissionais de saúde tomaram o problema para si, achando que a solução era simplesmente biomédica quando apressadamente e, em concordância com os impropérios do presidente, corroboraram em prescrever o kit Covid com a hidroxicloroquina, ivermectina e azitromicina que, tão cedo em 2020, se mostraram ineficazes para o tratamento dessa doença e além disso, desvirtuando o juramento a Hipócrates quando se refere à promoção da saúde e da vida. Isso mostra uma falha na formação acadêmica desses profissionais que tem uma formação humanística e política bem minguada para ter condições mínimas em perceberem o terreno que pisam.

Por conseguinte, dentro desse contexto, não se deve chamar de pandemia, senão de sindemia, um termo derivado das palavras “sinergia” e “pandemia” para se referir a uma situação em que uma doença que se manifesta numa população é favorecida para haver sua propagação por condições políticas, sociais, culturais, econômicas e outras que quando se misturam a elas muito contribuem para que a liderança política exerça o biopoder como uma forma de controle de corpos e indivíduos, categorizar a população para, a partir disso, definir o destino da sociedade que governa fazendo escolhas sobre os que devem viver, se isolar da sociedade e, até mesmo, morrer.

Diante disso, apreende-se que o vírus é político e esta sindemia não é simplesmente um problema biomédico, pois o vírus é fruto da exploração predatória da natureza sob as ordens do capitalismo, pois as atividades primárias como agricultura e pecuária já funcionam numa relação íntima com o mercado de ações e ignora qualquer sustentabilidade para alcançar o capital. Sem haver o uso sustentável dos recursos naturais, outras sindemias surgirão e se os lugares do planeta tiverem lideranças políticas como Jair Bolsonaro com apoio da cúpula econômica simpatizante com um neoliberalismo fascista que detém o controle dos meios de comunicação e apoiada por parte da população entorpecida como a do Brasil nessa fase da história do país, a humanidade correrá um sério risco de ser exterminada do planeta.

Marcos Vinícius, tradutor e professor.

Fonte da imagem: museudememes.com.br


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