ORGULHO AUTISTA E UM MANIFESTO

Semana passada, no dia 18 de junho, celebrou-se o dia do orgulho autista. É uma data em que autistas falam por si, diferente do dia 2 de abril, em que […]



Semana passada, no dia 18 de junho, celebrou-se o dia do orgulho autista. É uma data em que autistas falam por si, diferente do dia 2 de abril, em que mães, pais e profissionais falam sobre autismo no âmbito da conscientização. Assim como o dia do orgulho LGBT+, muitas pessoas se perguntam o porquê de celebrar o orgulho já que luta é por igualdade. 

O princípio é simples: o mundo é desigual e na luta por igualdade precisamos dar voz e participação aos que são oprimidos na lógica da desigualdade. 

Assim como várias outras condições neurológicas e psiquiátricas, autistas já sofreram todo tipo de discriminação, abusos, exclusão, negação de cidadania. Hoje autistas falam em orgulho de ser autista porque é um orgulho seguir resistindo às discriminações e aceitar-se e amar-se como é. 

A luta por inclusão é recente na história da humanidade. Só na década de 1990, iniciando-se nos EUA, o movimento de inclusão das pessoas com deficiência (PcDs) passou a clamar por participação das PcDs em sociedade, exigindo igualdade de direitos, uma vez que deficiência é parte da diversidade própria do ser humano. 

No Brasil de 2021, autistas falam de neurodiversidade (todo mundo tem cérebros diferentes), interseccionalidade e se organizam em associação DE autistas – diferente das associações PARA autistas, formadas por mães e pais e focadas no atendimento. A ABRAÇA é a Associação Brasileira para Ação por Direitos das Pessoas Autistas – a única associação de autistas no país. 

No dia 18 passado, a ABRAÇA lançou o Manifesto da Neurodiversidade Interseccional Brasileira. Segue aqui o texto em linguagem simplificada:

MANIFESTO DA NEURODIVERSIDADE INTERSECCIONAL BRASILEIRA

“Pelo reconhecimento e respeito à Neurodiversidade Interseccional

Autistas são humanos como todo mundo.

A neurodiversidade é saber que todo mundo tem diferentes cérebros. Com ou sem deficiência.

A interseccionalidade é saber que há outras diferenças além do autismo. Autistas não são só autistas. 

Autistas também são trabalhadores. Autistas são pais e mães de família. Autistas têm uma raça. Autistas têm um gênero. Autistas têm religiões diferentes. Autistas são pobres ou são ricos. Autistas são de vários locais. Autistas moram na cidade. Autistas moram no interior. Dentre outros. 

Nenhum autista pode ser julgado por ser diferente! 

É errado discriminar alguém por ser de uma raça, de um gênero ou por ser de uma classe social. Nós LUTAMOS contra isso. 

Defendemos a neurodiversidade! Defendemos a interseccionalidade. Queremos que respeitem nossas diferenças! 

O certo é chamar “pessoa autista”. Queremos ser chamados de “autista”. Não queremos ser chamados de “Síndrome de Asperger”. Não queremos ser chamados de “autistas graves”. Isso é discriminação!

Tem mulheres autistas, autistas pretas da “perifa”. Tem autista lésbica, bi, gay, trans. Tem autista indígena, refugiado, cigano. E principalmente, que fique claro, tem autista pobre!

Muitos autistas não têm condições financeiras. Muitos autistas têm baixa qualidade de vida. Muitos autistas  não conseguem acessar políticas públicas. Isso tem que mudar!

Nem todos os autistas conseguem emprego. Os empregos para autistas nem sempre valorizam as habilidades. Isso é preconceito! Isso é capacitismo!

Tem pessoa autista que precisa de cuidadores. Mesmo com apoio de cuidadores, o autista tem direito de expressar seus sentimentos, suas vontades. 

Na lei, autista é pessoa com deficiência. Os autistas têm todos os direitos que as pessoas com deficiência têm. 

Ter uma deficiência não deveria ser algo ruim. Se alguém precisa de apoios, o Estado precisa dar esses apoios. Isso não deve nos envergonhar. 

Tem também outros movimentos que são contra a discriminação. A luta antimanicomial diz que ninguém deve perder sua liberdade por ser diferente. A luta antirracista diz que ninguém pode ser discriminado por ser negro. Nós, autistas, também somos contra a discriminação!

Temos muitas reivindicações. Essa campanha é para que todos os autistas possam ter o direito a serem diferentes. Educação, saúde, proteção social. Nós defendemos que tudo isso tem que ser assegurado aos autistas. 

Nada sobre nós sem nós! Todos nós!

Autistar é resistir!”

( Saiba mais sobre a ABRAÇA em abraça.net.br)

O lema “nada sobre nós sem nós” é essencial na luta por direitos e participação cidadã. E de posse dessa voz reivindicamos participação em condições de igualdade e o direito a sermos diferentes, a aceitarem-nos e respeitarem-nos como somos. Concluo esse texto em primeira pessoa porque também sou autista, com orgulho!

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Jossely Oliveira é mulher autista e mãe de Lucy, 11 anos, e Alberto, 3 anos – ambos autistas. Ela é também presidenta da ASPAA – Associação de Pais e Amigos dos Autistas de Patos e Região.


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