Um estudo de janeiro de 2018 demonstra que um número elevado de autistas se declaram não-heterossexuais. Foram 69,7% de pessoas no espectro autista que se declararam assim, enquanto 30,3% de pessoas com desenvolvimento típico reportaram ser não-heterossexuais. No grupo de autistas da pesquisa houve altos índices de homossexualidade, bissexualidade e assexualidade.
Ontem, 28 de junho, foi o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAP+ e, dentre tantas demandas dessa comunidade, faz-se necessário falar sobre as interseccionalidades porque se trata da diversidade humana. Ambos os perfis frequentemente enfrentam esteriótipos negativos, discriminação e pressão para se adequarem a uma norma, se passarem por “normal”.
Autistas comumente têm dificuldade em compreender e lidar com convenções sociais, então é possível que essa “inadequação” ao pré-estabelecido tenha a ver com a razão pela qual reconhecer e admitir sua orientação sexual seja mais imperativo e natural para alguns autistas, mas para outros pode ser um fator de confusão se não tiver acesso a um ambiente seguro para compreender questões relacionadas à identidade de gênero e orientação sexual.
Há outros estudos sobre o tema em que o índice ficou em até 50% – ainda elevado, dado o contexto de heteronormatividade. O importante nesses dados é que profissionais que trabalham com o público autista precisam estar a par dessa realidade para que o suporte seja acessível e acolhedor. O estudo citado ainda relata a necessidade de programas de educação sexual especializada para que o suporte e a conscientização sejam ampliados.
O Brasil é um país com altos índices de crimes de homofobia. É, inclusive, o país que mais mata pessoas da comunidade LGBTQIAP+. Se falar de autismo já é uma tarefa necessária de conscientização, falar de autismo e diversidade na orientação sexual (que também é um amplo espectro) se faz igualmente necessário e urgente.
No espectro autista, há aqueles que têm maior dificuldade na comunicação, incluindo os não-oralizados, o que pode torná-los mais vulneráveis às mais variadas formas de abuso – desde abusos sexuais até a repressão de sua sexualidade, uma vez que há grupos de pais, cuidadores e profissionais que defendem equivocadamente uma eterna inocência nos autistas.
Em texto publicado ontem nas redes sociais da neuropsiquiatra Raquel Del Monde, ela traz informações de uma pesquisa nesse contexto interseccional que identifica 6 temas relatados como desafiadores: 1) autoaceitação; 2) autismo como fator complicador na identificação da orientação sexual; 3) estressores sociais e sensoriais afetando expressão sexual; 4) sensação de maior incompreensão e isolamento; 5) dificuldade de encontrar relacionamentos satisfatórios; 6) dificuldade de reconhecer e identificar suas necessidades sexuais. Esse grupo representado nessa interseccionalidade (autismo e não-heterossexualidade) apresenta alto risco para depressão, ansiedade e ideação suicida.
Por tudo isso, informações baseadas na ciência, educação, respeito, aceitação e acolhimento são imperativos para a população autista LGBTQIAP+. Quando se trata de existência, amor é uma necessidade básica do ser humano. Que seja respeitado o direito de amar em segurança e a quem se quiser amar. Amor é amor! 🏳️🌈❤️
*Pesquisa citada: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/29159906/
**Texto Sexualidade e Autismo, no Instagram de @draraqueldelmonde
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Jossely Oliveira é mulher autista, mãe de autistas e presidenta da ASPAA.