Autoridades da cidade de Memphis, nos Estados Unidos, divulgaram, na noite desta sexta-feira (28), mais de uma hora de filmagem mostrando o espancamento promovido por policiais do jovem negro de 29 anos Tyre Nichols, no início deste mês.
Os materiais divulgados incluem três vídeos de câmera corporal de agentes e um vídeo de 31 minutos extraído de uma câmera de vigilância de um poste da rua.
Nota do editor: esta reportagem contém descrições de violência
Os vídeos capturaram a brutalidade que sua família e outras autoridades já haviam prenunciado: ele levou socos e chutes enquanto era segurado pelos policiais, implorou para ir para casa e gritou repetidamente por sua mãe. Nichols precisou ser hospitalizado e morreu em 10 de janeiro.
Quando as agressões cessaram, enquanto Nichols estava caído imóvel escorado em um carro, os policiais andaram pela cena e ignoraram o jovem.
Os vídeos mostram partes primeira abordagem, na qual Nichols é parado no trânsito na noite de 7 de janeiro, e uma segunda briga minutos depois, depois que Nichols fugiu do primeiro local a pé.
“O que você está vendo é um número bastante significativo de policiais que estão falhando nas táticas de prisão e controle e compensando isso com brutalidade”, disse John Miller, analista da CNN.
Os analistas de segurança pública que assistiram aos clipes ficaram preocupados com uma série de ações – e inações – durante o encontro, desde o espancamento de um grupo de policiais até o tempo que levou para alguém prestar ajuda a Nichols, que estava imóvel.
Os vídeos deixam muitas perguntas sem resposta, inclusive o motivo da parada, que os policiais não explicam nos clipes.
A polícia de Memphis disse inicialmente que Nichols foi parado por suspeita de direção imprudente, mas o chefe de polícia Cerelyn “CJ” Davis disse à CNN nesta sexta-feira que as autoridades não foram capazes de “comprovar essa” alegação.
Os clipes também não respondem por que as autoridades usaram tanta força contra Nichols, que não parecia revidar, e por que se sentiram compelidos a confrontá-lo duas vezes.
Mas os vídeos lançam luz sobre o quão violento foi o confronto fatal.
Ameaças repetidas
Vídeos dos confrontos capturam vários policiais ameaçando Nichols repetidamente com violência enquanto ele parece cumprir seus comandos ou já está no chão.
Um vídeo de câmera corporal que captura o encontro inicial entre Nichols e a polícia mostra o policial saindo do carro com a arma apontada e captura um policial gritando para Nichols “Saia do carro”.
Nichols é ouvido dizendo: “Eu não fiz nada” e, mais tarde, ao cair no chão: “Tudo bem, estou no chão”.
Um policial grita com ele: “Put*, coloque as mãos atrás das costas antes que eu […] eu vou te dar uma surra.”
Nichols diz: “Só estou tentando ir para casa.”
Enquanto os policiais gritam comandos, Nichols responde repetidamente que está no chão e é ouvido dizendo que não fez nada, antes de fugir quando um oficial aciona seu taser.
No segundo encontro, onde ocorre o espancamento, uma câmera corporal captura um policial gritando com Nichols: “Vou dar uma surra em você”, enquanto Nichols está no chão e não revida.
Um policial também é ouvido perguntando “Você quer que eu use spray [de pimenta] de novo?”, enquanto Nichols está no chão e gritando por sua mãe.
Policiais o atingiram nove vezes em menos de 4 minutos
O vídeo tirado de uma câmera controlada remotamente em um poste da vizinhança mostra policiais de Memphis batendo continuamente em Nichols pelo menos nove vezes, sem provocação visível.
“O vídeo da câmera do poste é o que realmente justifica as acusações”, disse o ex-comissário de polícia da Filadélfia Charles Ramsey, analista da CNN.
“Ninguém treina para isso. Esses caras estão agindo tão fora dos limites que você realmente não consegue explicar. Um policial o chutou com tanta força e tanto que ele está mancando”, acrescentou.
No vídeo do poste, um policial é visto empurrando Nichols na calçada com o que parece ser sua perna ou joelho. Nichols é então puxado pelos ombros e chutado no rosto duas vezes, depois é atingido nas costas com o que parece ser um cassetete. Segundos depois, ele é atingido novamente.
Assim que ele é posto de pé, os policiais são vistos batendo no rosto de Nichols várias vezes, enquanto outros policiais prendem suas mãos atrás do corpo.
Nichols é visto caindo de joelhos – e menos de um minuto depois, um policial aparece para chutá-lo.
Ninguém interveio
Além da violência excessiva, o que incomodou Porcher foi que “nenhum policial estava disposto a intervir e dizer pare”, disse ele à CNN na noite de sexta-feira.
“Há um ponto em que você tem que interceder e dizer “Pare!” ou se colocar fisicamente entre o policial que está agredindo a pessoa e aquele indivíduo real. E isso não aconteceu”, disse Porcher.
De acordo com as políticas do Departamento de Polícia de Memphis, os policiais têm o dever de intervir.
“Qualquer membro que observe diretamente outro membro envolvido em conduta perigosa ou criminosa ou abuso de um assunto deve tomar medidas razoáveis para intervir”, de acordo com uma página de política do departamento.
Cinco policiais de Memphis foram demitidos pelo caso por violar as políticas policiais e cada um foi acusado de assassinato em segundo grau, entre outras acusações.
Dois funcionários do corpo de bombeiros que faziam parte do “atendimento inicial ao paciente” de Nichols foram afastados do cargo “enquanto uma investigação interna está sendo conduzida”, disse a oficial de informações públicas do departamento, Qwanesha Ward, a Nadia Romero, da CNN.
Após a divulgação do vídeo, o xerife do condado de Shelby, Floyd Bonner Jr., disse que iniciou uma investigação interna sobre a conduta de dois policiais “que apareceram no local após o confronto físico”. Ambos “foram dispensados do serviço” enquanto se aguarda o resultado da investigação, disse o xerife.
Indignação gerada pelo caso levou a protestos
Ninguém foi preso durante a manifestação, de acordo com o porta-voz da polícia do Departamento de Polícia de Memphis, Louis Brownlee.
Estima-se que haja menos de 100 manifestantes e eles parecem estar começando a se dispersar, disse Brownlee, na noite desta sexta.
Três manifestantes foram presos na noite de sexta-feira na Times Square, um dos quais foi visto pulando no capô de um veículo policial e quebrando o para-brisa, confirmou um porta-voz do Departamento de Polícia de Nova York à CNN.
A pessoa que supostamente quebrou o para-brisa do veículo foi indiciada por danos criminais. Não há mais detalhes sobre as outras duas prisões.
Os protestos na cidade de Nova York foram em grande parte pacíficos, apesar das três prisões e alguns pequenos confrontos entre a polícia e os manifestantes na cidade.
* Andy Rose, Jamiel Lynch, Elizabeth Hartfield, John Bonifield, Shawn Nottingham e Mallika Kallingal, da CNN, contribuíram para esta reportagem