
Medida que entra em vigor nessa quarta-feira e retomada da guerra comercial entre EUA e China têm potencial para desestabilizar o comércio global. Entenda os riscos e como o governo brasileiro e os empresários podem se preparar.
O recente anúncio de tarifas comerciais pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, batizada de ‘tarifaço’, marca um novo capítulo na escalada das tensões no comércio global. O governo Trump criou as denominadas tarifas recíprocas, que afetam as importações estadunidenses de produtos de mais de 180 países, incluindo o Brasil. As tarifas com alíquotas de 10% começaram a vigorar no sábado (5 de abril) enquanto as superiores entram em vigor em definitivo nessa quarta-feira (9 de abril).
O Brasil foi taxado na tarifa mínima de 10%, enquanto a China passará a contar com tarifas de 104%, resultado da intensificação de uma nova guerra comercial entre os dois países. Trump já havia anunciado tarifas de 20% sobre produtos chineses no início de março e, na semana passada, somaram mais 34%, totalizando 54%. A China revidou e anunciou a mesma tarifa de 34% sobre produtos importados dos EUA e, assim, a resposta de Trump foi anunciar uma taxa adicional de 50% aos produtos da China, chegando assim aos 104% que entraram em vigor na madrugada desta quarta.
O ‘tarifaço’ anunciado por Donald Trump pode ser, em parte, uma jogada estratégica, seja para pressionar outros países a adotarem medidas favoráveis aos interesses dos EUA, seja para agradar sua base eleitoral. No entanto, essa política tem potencial para sair pela culatra. Na prática, ela já começa a causar prejuízos não só à economia global, mas também às empresas estadunidenses, inclusive gigantes como as de Elon Musk, que já enfrentam perdas bilionárias.
Como reação inicial, muitos países estão apostando na diplomacia. No entanto, caso o diálogo não avance, os países também podem adotar medidas mais estruturais. Entre elas, a criação de novas redes de comércio e a reorganização das cadeias produtivas e de consumo, com o objetivo de reduzir sua dependência dos EUA. Isso não apenas minimizaria os impactos negativos das tarifas, mas também poderia isolar economicamente os EUA e pressionar politicamente o governo a rever sua postura.
Desafios e oportunidades para o Brasil
É fato que a economia global está cada vez mais interconectada, e as decisões tomadas por Washington e Pequim moldam mercados, cadeias de suprimento e fluxos de capital mundo afora. A volatilidade cambial e dos preços das commodities, que tende a se acentuar em períodos de incerteza geopolítica, impacta diretamente as exportações brasileiras, que ainda dependem fortemente de matérias-primas.
No mesmo dia em que Trump anunciou o tarifaço, a Câmara dos Deputados aprovou o projeto da chamada Lei da Reciprocidade, que autoriza o governo brasileiro a adotar medidas de retaliação contra países ou blocos que impuserem barreiras comerciais aos produtos brasileiros. A proposta, que uniu governo e oposição em votação unânime de 70 votos no Senado no dia anterior, seguiu para sanção do presidente Lula.
No entanto, é importante que o governo brasileiro atue com inteligência e pragmatismo, buscando oportunidades mesmo em um ambiente global mais instável e imprevisível. A proximidade dos governos brasileiro e chinês pode abrir uma janela estratégica para que empresas e produtos brasileiros possam ocupar o espaço deixado por seus concorrentes estadunidenses.
Da mesma forma, apesar de tudo, o bom diálogo entre os governos brasileiro e estadunidense pode abrir espaço para eventuais acordos e, vale ressaltar que, em comparação com outros grandes players do comércio global, o Brasil teve um impacto relativamente moderado no tarifaço. Enquanto as tarifas impostas aos produtos brasileiros ficaram no piso de 10%, a União Europeia enfrentou tarifa de 20%. E até aliados dos EUA, como Taiwan (32%) e Israel (17%) tiveram tarifas mais altas. Nesse contexto, a medida pode não significar uma perda de espaço no mercado estadunidense para o Brasil. Ao contrário, pode até abrir oportunidades de aumentar as exportações brasileiras para os EUA e para países que decidirem retaliar.
Para os empresários, especialmente os exportadores e os que desejam se internacionalizar, esse novo cenário exige atenção redobrada e adaptação rápida. Monitorar tendências internacionais, diversificar mercados e buscar diferenciação nos produtos são ações-chave para transformar a crise em vantagem competitiva, porém é necessário que eles estejam preparados para atender exigências técnicas e regulatórias dos mercados mais exigentes.
A nova guerra comercial que está se desenhando entre EUA e China não é apenas uma disputa entre gigantes, ela afeta diretamente todos os países, inclusive o Brasil, que pode sair prejudicado ou beneficiado, dependendo da sua capacidade de reagir com estratégia, inovação e diplomacia econômica. Do mesmo modo, o ‘tarifaço’ de Trump é mais um lembrete de que o mundo está em constante transformação, e quem souber se mover com agilidade pode transformar turbulência em oportunidade.
Ricardo Medeiros
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