NEGACIONISMO E CAMPANHA ELEITORAL NO ÚLTIMO PRONUNCIAMENTO DE JAIR

Primeiro, é importante situar o pronunciamento de Jair Messias Bolsonaro no último dia 02 de junho:  1) Ele ocorre na fase mais crítica da pandemia que segue em descontrole, 2) […]



Primeiro, é importante situar o pronunciamento de Jair Messias Bolsonaro no último dia 02 de junho: 

1) Ele ocorre na fase mais crítica da pandemia que segue em descontrole, 2) Em meio a uma investigação no Congresso através da CPI da Pandemia, que tem atingido altos índices de audiência na internet e 3) Pressionado por números de pesquisa para as próximas eleições que indicam Lula subindo e Bolsonaro caindo. 

Seu pronunciamento parecia um discurso de campanha com dados embelezados, mas quero focar apenas em dois trechos, que correspondem ao que proponho no título desse texto. O trecho abaixo foi literalmente dito por Bolsonaro em seu último pronunciamento. No quarto parágrafo ele diz:

NESTE ANO, TODOS OS BRASILEIROS, QUE ASSIM O DESEJAREM, SERÃO VACINADOS. VACINAS ESSAS QUE FORAM APROVADAS PELA ANVISA.

Considero esse o parágrafo mais grave em seu pronunciamento. Bolsonaro claramente não defende a vacinação. Quando ele diz que serão vacinados “todos os brasileiros que assim o desejarem”, ele reforça sua posição de que a vacina não seja obrigatória. Qual o interesse de Bolsonaro nisso?

Desde o início da pandemia, as falas do presidente foram no sentido de alienar a população sobre a severidade da situação em que estamos. Ele minimizou o efeito do vírus, estimulou aglomerações e não deu exemplo no uso da principal barreira física para o vírus – a máscara. 

Como se não bastasse, quando surgiu o debate sobre as vacinas, Bolsonaro fazia questão de repetir que não compraria vacinas chinesas, que não ia obrigar os brasileiros a se vacinarem, desinformou sobre supostos efeitos perigosos da vacina e, como sabemos, seu governo ignorou dezenas e dezenas de emails da Pfizer e do próprio Butantan que tratavam de contratos para produção e compra de vacinas.

Bolsonaro sempre defendeu a imunidade de rebanho para que a maioria da população adquirisse Covid-19 e assim não fosse necessário reduzir a circulação de pessoas, nem investir em vacinação. Bolsonaro ignorou solenemente o genocídio que isso provocaria. São quase meio milhão de brasileiros mortos nessa aposta macabra. 

O quão grave é um presidente não defender vacina? Não incentivar a vacinação e não construir uma campanha nacional para isso é também um boicote às ações de combate à pandemia, uma vez que só poderemos falar em população imunizada quando 70% a 80% da população estiver vacinada e não houver mais transmissão comunitária.

A intenção nas falas de Bolsonaro é comunicar-se apenas com seu público e continuar fidelizando. Ele sabe o que fala, que sua comunicação é distorcida e que se comunica bem com essas pessoas. Ele conta com o resultado de seu trabalho de alienação constante. A gente constata isso vendo o quanto frases isoladas de seu pronunciamento são repetidas literalmente como mantras nas discussões com seus apoiadores. O texto daquela noite foi claramente construído para isso. 

Bolsonaro encheu seu discurso de dados em frases curtas que distorcem a realidade, mas também torna fácil o trabalho de repetir suas ideias. Por exemplo, quando ele fala em crescimento econômico no primeiro trimestre, precisamos perguntar para quem esse crescimento foi direcionado. Os dados e a experiência diária que temos é que a feira não está mais barata, o desemprego só tem aumentado e o Brasil retorna ao mapa da fome com milhões de brasileiros voltando a ficarem abaixo da linha da pobreza. O crescimento econômico anunciado certamente não é realidade para a imensa população brasileira. Mas bolsonaristas repetem a (des)informação mesmo assim, num delírio de que o Brasil está melhor com Bolsonaro.

Importante também ressaltar que Bolsonaro tem mencionado que NESSE ANO os brasileiros que quiserem serão vacinados tem relação com o que João Dória, governador de São Paulo e seu opositor declarado, anunciou dias antes do pronunciamento: que toda a população de seu estado estaria vacinada ainda esse ano. Dória, que também está em corrida presidencial, já antecipou mais uma vez o calendário de vacinação de seu estado, marcando lugar nessa disputa de narrativas. Flávio Dino, do Maranhão, também disputa narrativas e tem ambições presidenciais.

Outra cutucada para um candidato na corrida presidencial e seus eleitores ocorreu no trecho abaixo:

“DESTINAMOS, EM 2020, R$ 320 BILHÕES PARA O AUXÍLIO EMERGENCIAL PARA ATENDER AOS MAIS HUMILDES. ESSE MONTANTE EQUIVALE A MAIS DE 10 ANOS DE BOLSA FAMÍLIA”.

Sabemos que nunca foi sua intenção garantir auxílio emergencial no valor pelo qual o Congresso disputou e aprovou no início da pandemia. E quando Bolsonaro compara o valor destinado ao auxílio com o Bolsa Família, ele está, na verdade, tentando comparar o seu governo com o de Lula, que executou a política do benefício. Segundo pesquisas, o auxílio emergencial foi o que garantiu popularidade de Jair nos meses de pagamento – que voltou a cair quando foi interrompido e quando foi relançado com um valor muito abaixo das necessidades da população que o recebe.

Trago esses comentários sobre o último pronunciamento do presidente e suas respectivas contextualizações porque estamos em meio a uma crise sanitária muitíssimo piorada pela comunicação perversa de Jair e pelos efeitos igualmente perversos em seus seguidores que o ajudam a boicotar uma condução responsável da pandemia e também o ajudam em sua corrida presidencial, já que agem como se Jair nunca tivesse saído de campanha, desde 2016.

Nada mudará a visão dos que hoje ainda apoiam Bolsonaro. Eles não são maioria, mas fazem barulho e são agentes do caos como o seu líder. Falam em ‘politização’ da pandemia como se não estivesse sendo usada para fins eleitoreiros pelo presidente. Atribuir a seus opositores um comportamento criminoso que é seu é uma das armas de guerra na comunicação fascista. É importante que estejamos atentos e combativos à narrativa de Jair e seus minions porque disso depende nossa sobrevivência ao fascismo desse governo. 

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Jossely Oliveira é profissional na área das Letras, curte Análise do Discurso (ferramenta que usou para produzir o texto acima) e anseia o fim da pandemia tanto quanto o fim do bolsonarismo.


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